O que já não era uma beleza pode ficar pior ainda no tripé formado por médicos, pacientes e planos de saúde. Nem é preciso dizer que as partes mais fracas (as duas primeiras) serão As maiores prejudicadas por mudanças articuladas silenciosamente e em tramitação agora mesmo no Congresso Nacional.
Em 29 de novembro, quando redigia esta coluna, para alertá-lo, prezado leitor, a Comissão Especial da Câmara dos Deputados que trata da regulamentação das operadoras de seguros e de planos de saúde estava prestes a aprovar uma série de projetos para alterar a Lei 9.656/98, que significa evidente retrocesso à
saúde suplementar.
Sabemos bem como se portam certos parlamentares. Se não houver mobilização popular, direitos que levaram anos a ser conquistados serão aniquilados em um piscar de olhos. O lobby empresarial é tão pesado que inclusive cogita-se a possibilidade de o paciente que possui plano de saúde não poder mais recorrer ao Código de Defesa do Consumidor, caso sinta-se ludibriado.
Ao todo, são 140 projetos em análise na Comissão. Boa parte tolhendo os usuários dos planos de saúde. Não é de hoje que as empresas se sobrepõem a pacientes, médicos demais prestadores de assistência, utilizando o poder econômico, sob vista grossa de quem deveria atuar pela harmonia do setor: a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
Isso fica patente quando analisamos os reajustes aplicados aos planos coletivos, por exemplo. Aproximadamente 75% deles são considerados abusivos pela Justiça, segundo pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec). Enquanto isso, as reclamações de usuários por mau atendimento só aumentam e os recursos humanos são subremunerados. Sem falar que é queixa constante entre os médicos o cerceamento a prescrições de exames.
Há muitas outras alterações escandalosas em estudo na Comissão Especial da Câmara dos Deputados, como o abrandamento das multas das operadoras em casos de irregularidades e a redução das garantias patrimoniais exigidas para funcionamento. Os planos de saúde ainda tentam criar produtos com cobertura limitada praticamente ao campo ambulatorial, os quais batizam, pasme a
ironia, de “populares”.
Aliás, os tais “planos populares ou acessíveis”, além de retirar direitos, inflarão ainda mais o atendimento pelo Sistema Único de Saúde, que assumirá todos os procedimentos caros e de complexidade.
Até o consagrado no Estatuto do Idoso está ameaçado. Pretendem liberar reajustes dos planos a quem tiver mais de 59 anos de idade. Pior, por faixas: aumentos aos 59, 64, 69, 74 e 79 anos.
Ao mesmo tempo, a Câmara pode reduzir o rol de procedimentos e de tratamentos, o que afeta a qualidade da relação entre médico e paciente, além dos diagnósticos, exames laboratoriais, internação, cirurgias etc.
Planos de cobertura limitada comprometem todo o trabalho do profissional de saúde. Muitos casos começarão a ser cuidados via saúde suplementar e, na hora das complicações, despejados na rede pública.
A Sociedade Brasileira de Clínica Médica, da qual sou presidente, assim como a Associação Paulista de Medicina (APM), Idec, ProTeste e diversas instituições da sociedade civil têm condenado veementemente o retrocesso que se desenha. Conclamo você também a se manifestar, cobrando os parlamentares que elegeu por carta, e-mail, redes sociais e telefonemas. A classe política tem o dever de ouvir e considerar nossa voz.
Antonio Carlos Lopes, presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica