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Estudo alerta para o aumento do risco de morte em pacientes com fibrilação atrial que tomam digoxina


Pacientes com fibrilação atrial medicados com digoxina, um dos medicamentos mais antigos usados na cardiologia, para controlar seus sintomas relacionados com alta frequência cardíaca apresentam maior risco de morte, independente de terem ou não um diagnóstico de insuficiência cardíaca, comparados com pacientes que não recebem a droga. E o perigo aumenta de acordo com níveis mais altos da substância na corrente sanguínea, de acordo com um estudo apresentado no 66º Congresso Científico do American College of Cardiology em Washington DC, USA. Os pesquisadores afirmam que a pesquisa é uma das análises mais amplas e abrangentes do uso do medicamento até hoje.

"Com base nesse estudo, a digoxina deveria ser evitada em pacientes com fibrilação atrial, principalmente se os sintomas podem ser controlados com outros tratamentos", disse Renato Lopes, doutor e professor de medicina na divisão de Cardiologia da Duke University Medical Center. "Nós mostramos que a digoxina estava associada ao aumento do risco de morte e de morte súbita, independente de o paciente ter insuficiência cardíaca. Portanto, a partir dessa descoberta, evitar a administração de digoxina em pacientes com fibrilação atrial parece ser a melhor conduta”.

A fibrilação atrial é um tipo de arritmia que faz com que as câmaras superiores do coração (“átrios”) batam erraticamente e potencialmente levem à formação de coágulos no coração potencialmente levando a ocorrência de acidente vascular cerebral. Ela afeta cerca de 9% das pessoas com mais de 65 anos nos Estados Unidos. Cerca de 30% dos pacientes com fibrilação atrial tomam digoxina no mundo todo, explica Lopes. A droga é uma das medicações mais antigas usadas na cardiologia e é muito barata. No entanto, a segurança de seu uso em pacientes com fibrilação atrial virou objeto de discussão, diz o medico especialista.

"Muitas publicações recentes questionaram a segurança dessa droga, e diferentes estudos com diferentes análises mostraram resultados conflitantes. Não há nenhuma informação proveniente de estudos randomizados que assegure a eficácia e a segurança da administração de digoxina em pacientes com fibrilação atrial", ressalta Lopes.

Para chegar a uma resposta mais definitiva sobre a segurança da digoxina, Lopes e seus colegas analisaram dados coletados no estudo ARISTOTLE, que comparou os anticoagulantes apixabana e varfarina na prevenção de coágulos, AVCs e morte em pacientes com fibrilação atrial. Dos 18.201 pacientes incluídos no estudo, 5.824 utilizavam digoxina no começo e 4.424 tiveram seus níveis no sangue medidos durante a pesquisa. Um total de 6.993 pacientes apresentavam também insuficiência cardíaca.

Para tentar compensar a falta de um estudo randomizado, que contemplasse a digoxina versus uma terapia alternativa (um placebo ou uma outra medicação antiarrítmica, por exemplo) em uma comparação direta e randomizada, os pesquisadores ajustaram suas análises para cerca de 50 variáveis de confusão como comorbidades clínicas, medicações, histórico médico, o cenário clínico onde a digoxina foi introduzida (hospital ou ambiente ambulatorial) e biomarcadores no sangue que podem ajudar a prevenir o risco de morte, entre outros fatores que potencialmente poderiam interferir nos resultados. Cada paciente que tomava a droga foi comparado com três outros controles que também participavam do estudo ARISTOTLE e não estavam com a mesma medicação.

Os pesquisadores descobriram que, em pacientes que já estavam tomando digoxina (mais propensos a tolerarem seus efeitos, portanto), a relação geral entre o uso da droga e o risco de morte era insignificante. No entanto, mesmo nesses casos, o risco estava associado à concentração da substância no sangue: para cada 0.5 ng/mL a mais no nível de digoxina no sangue, o risco de morte aumentava em 19%. Entre os pacientes cujos níveis do medicamento eram maiores do que 1.2 ng/mL, o aumento na taxa de mortalidade foi de 56%. “Portanto, em pacientes com fibrilação atrial já tomando digoxina, cujo tratamento com tal medicação é considerado extremamente necessário como a única opção terapêutica para controle dos sintomas, a monitorização dos níveis sanguíneos de digoxina se faz necessário, buscando-se como alvo terapêutico níveis séricos menor de 1.2ng/mL.

O risco de morte era ainda maior em pacientes que não estavam tomando digoxina antes de entrarem no estudo ARISTOTLE, mas que passaram a fazer uso da droga no decorrer do mesmo. Esses pacientes tiveram um aumento de 78% no risco de morte geral e aumento de quatro vezes no risco de morte súbita após começar a medicação.

"A maior parte das mortes súbitas ocorreram dentro dos primeiros seis meses de tratamento com digoxina", disse Lopes. “Isso sugere uma relação de causa e efeito, diz ele, apesar do fato desse estudo não ser randomizado, única maneira de se comprovar definitivamente uma relação causal entre uso de digoxina e mortalidade.: afirma Lopes.

A falta de randomização e o potencial que fatores de confusão não medidos podem ter sobre o estudo são as suas principais limitações, ele argumenta. Além disso, no caso de pacientes que estavam usando digoxina no começo do estudo, os pesquisadores não sabiam há quanto tempo eles vinham ingerindo a droga antes de iniciar o estudo. Apesar disso, a pesquisa é uma das mais abrangentes no campo até hoje, incorporando variáveis clínicas, biomarcadores e os níveis de digoxina no sangue.

"Para afirmar definitivamente a eficácia e a segurança da digoxina em pacientes com fibrilação atrial teríamos que fazer um estudo randomizado de larga escala", ele diz. "Até lá, nossa descoberta é de que a digoxina pode estar causando mais mal do que bem em pacientes com fibrilação atrial, uma informação que deve ajudar médicos que assistem esses pacientes em suas decisões clínicas”, explica Lopes. No estudo ARISTOTLE, a apixabana se mostrou estatisticamente superior à varfarina na prevenção de coágulos sanguíneos, AVCs, hemorragias e morte, independente de os pacientes estarem ou não tomando digoxina ao entrarem no estudo.

O estudo sobre a segurança do uso de digoxina é resultado de uma parceria entre os laboratórios Bristol-Myers Squibb e Pfizer Alliance, em conjunto com o Instituto de Pesquisa Clinica da Duke University.


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